Diários de Lisboa

Um comentario por dia, dá direito a uma lobotomia...

sábado, outubro 23, 2004

Bicho-Frade


Uma das (des)vantagens de morar numa zona campestre é o aumento verdadeiramente exponencial de encontros imediatos com diversas espécies animais. E, claro, pela lógica estatística, desses animais a grande maioria são insectos. Ultimamente, não sei bem porquê, esta espécie em particular, o Bicho-Frade, aqui retratado numa pose algo desafiadora do lado de fora da janela de minha casa, insiste em agarrar-se à roupa estendida ao sol (será que lhe agrada o quentinho da roupa? ou é viciado no cheiro do detergente? será um crítico de moda?). De maneira que têm sido frequentes as situações em que um grito esbaforido da minha-mais-que-tudo, quando recolhe a roupa sêca, significa que lá tenho eu de fazer o papel de macho-exterminador-protector do lar. Ela sai a correr do quarto e entro eu para um desafio cara-a-cara com o bicho. O desenlace é bastante simples e pacífico: eu agarro-o suavemente com um pano e lanço-o janela fora, o que é bom para ele porque vive, e é bom para mim porque estes animaizinhos quando esmagados soltam um cheiro verdadeiramente pestilento. Além disso, a minha consciência fica mais tranquila.

sexta-feira, outubro 22, 2004

Verde Alface

Depois de várias críticas ao "cinzentismo" do anterior template deste blog, achei por bem reencontrar a identidade cromática dos Diários de Lisboa: verde alface, pois então! Os postulados continuam os mesmos, a liberdade de escrita rege-se pelos mesmo princípios e a abertura a comentários de gorgulhos externos é total. Só a cor é diferente.

sexta-feira, outubro 15, 2004

O frio


E lá veio o frio, a troca de guarda-roupa (caixa acima, caixa abaixo, desarruma roupeiro, arruma roupeiro), o nariz a fungar, a roupa vestida em estilo cebola (às camadas), o desenferrujar dos aquecedores, cagar o porta-bagagens do carro com lenha, comprar laranjas para reforçar os níveis de vitamina C no organismo, o sexo com toneladas de cobertores por cima (isto quando a vontade simplesmente não esmorece com o tempo que demora a despir a roupa para "lá" chegar), os palavrões logo ao amanhecer quando o frio envolve o primeiro pé a sair da cama, o suplício da higiene diária em pêlo, o ridículo de conduzir de luvas, o nariz ferido de tanto se assoar, os pés ensopados de chuva, ninguém na rua, o Sol sempre atrás das nuvens (é por isso que elas tanto "choram" não é?), as noites que duram mais ou os dias que duram menos, o frio, o frio, o frio...

Só espero que volte a nevar em Alcongosta!
Bruno

quinta-feira, outubro 07, 2004

Re Definições


Peço emprestado o título do último album dos Da Weasel, não porque o tenha ouvido e gostado muito mas simplesmente porque o conceito vem a calhar para explicar umas coisinhas. Este singelo blog foi criado numa altura em que a maioria dos seus fundadores ainda morava em Lisboa. Por razões que cada um deles poderá explicar em causa própria, se assim o entender, deixaram de morar na Grande Alface. Eu fui um deles... mas agora também não quero explicar nada.
Ora, psicologias de algibeira à parte - que eu hoje estou mais inclinado para o pensamento rasteiro e para o discurso fácil -, parece-me que se coloca um interessante problema de identidade a este blog: diários de lisboa escritos por quem (já) não mora em Lisboa? Exacto, é assim mesmo que vai ser. Não se fala mais nisso. Adiante...
Ele existe, o blog. Está aqui mesmo à mãozinha de semear e podemos escrever nele o que bem nos apetecer. Portanto, ponto dois da agenda "Como aproveitar a disponibilidade deste blog?" fica assim convenientemente debatido e encerrado.
O ponto três, até pela estética cabalística do número, apresenta um labirinto mais intricado: "O que escrever?" A conclusão a que cheguei é digna de um grão-mestre taberneiro: o que nos aprouver!
Finalmente, já em jeito de adenda, a todos vós, leitores, digo que não precisam de vir cá todos os dias.
Salvem o gorgulho da Alface!
Bruno

quarta-feira, outubro 06, 2004

janela

um dia qualquer visto da minha janela de Alcongosta
(e andei a aprender como se "postam" fotos nossas nos blogs)
Bruno

Lisboa com amigos e muito gelo


Aprendi a gostar de Lisboa à distância. Nestes quase três anos (já passou assim tanto tempo?!) a viver no Fundão, as idas à capital assumem uma importância quase terapêutica: lá reside quase tudo o que me vai na memória. Essa impressão digital que Lisboa deixou na minha cabeça - apercebo-me agora – é um mapa de sensações. E eu, que só lá vou para olhar, descubro a limpidez de tudo. Não é um exercício demasiado racional, nem é excessivamente poético. É, acima de tudo, pessoal. Conhecer a geografia de uma cidade como Lisboa de olhos fechados implica que foi nela que crescemos e que lá continuam penduradas entre os prédios as várias peles que despimos. Até mesmo a vontade de lhe virar costas e regressar furtivamente como um amante burlesco tem qualquer coisa de passional, de deliciosamente indefinido.
alargo os braços de uma margem à outra numa ponte em hora de ponta com o pôr-do-sol infectado pelas cores dos escapes em fumo. este é o meu postal urbano sem palmeiras no horizonte
As pessoas. As pessoas que emergem das ruas e das portas dos bares à noite, principalmente se forem amigos. Diluímos a conversa no gelo dos whiskies, refrescamos os sorrisos, soletramos os nomes uns dos outros. Lisboa é o ponto nevrálgico da minha empatia e o que fica das noitadas, da música, dos cigarros, dos copos é a alquimia do afecto. No dia seguinte estala-me a cabeça com a ressaca da distância.
Bruno